segunda-feira, julho 31, 2017

Os dedos trémulos pousados sobre o teclado, o cursor a viajar sobre o botão ENVIAR e o coração mais apertado que umas coxas 40 metidas num tamanho 38. Teresa sabia bem das consequências que poderiam advir daquele impulso que faltava dar ao seu indicador direito e se por um lado tinha a certeza de ser sua obrigação fazê-lo, por outro pensava que talvez... talvez não fosse assim tão boa ideia. Mas como ocultar os factos? Pior, como viver com os factos ocultados? Já és uma menina grande, dizia a sua consciência, por isso porta-te como tal!

- Em que pensas, querida?
Teresa deu um salto na cadeira e acordou do seu estado de transe.
- Assustei-te?
- Não, amor! Eu é que estava distraída. Chegaste cedo!
- Ficámos de ir jantar a casa dos teus pais, lembras-te? E já estamos atrasados! Sabes como a tua mãe fica quando os fazemos esperar...
Teresa baixou a janela da caixa postal, fechou o portátil e saiu apressada com o marido.


De hoje não passa, pensava Teresa enquanto olhava através da janela do táxi que a conduzia a casa. De hoje não pode passar. E instintivamente, acariciou a barriga que não tardaria, começaria a crescer.


Foi Duarte quem fez o envio. Os 5 meses passados desde o acidente permitiram-lhe a tranquilidade para o fazer. A dor que sentiu no malfadado dia em que abriu aquela janela guardada à pressa e leu a traição de que tinha sido alvo ainda lá estava, nunca o deixaria tinha a certeza. Mas  a visão diária da sua Teresa, deitada naquela cama de hospital, imóvel e inconsciente, ligada a uma parafernália de tubos e máquinas, portadora de vida, a vida que ele nunca conseguiria gerar, já que sabia não poder ter filhos, e que crescia a olhos vistos, fê-lo pensar que havia ali um pequeno ser que merecia a verdade. Um ser que ainda antes de nascer o ensinou a colocar o orgulho, a raiva e o ciúme de lado e a ter um gesto de grandeza humana: permitir a um pai saber que o é.


(escrito a 3 de Outubro de 2013)